Afinal, Bitcoin é Dinheiro ? 6 pontos para considerar.
A discussão se bitcoin é ou não dinheiro existe a um bom tempo, a melhor forma de tirar as próprias conclusões é entendendo o que é dinheiro, e para isto iremos analisar as características de algo que
** Este artigo foi inicialmente publicado no site Fintser no dia 23/05/2021 **
Introdução
É verdade que o número de detentores de Bitcoin tem crescido exponencialmente no último ano, principalmente por conta do atual ciclo de Bull Market (Mercado touro, que significa um ciclo de alta, crescimento dos preços). Em março de 2020, o que ficou bastante conhecido como “corona crash” levou o preço do Bitcoin a oscilar abaixo dos $ USD 4 mil, o que deixou muitos investidores preocupados na época, em grande maioria investidores poucos experientes.
Aqueles que acreditaram nos fundamentos e que entendem os ciclos de mercado não viram um “problema” mas sim uma oportunidade de comprar com desconto, se você ainda não entende muito bem como o Bitcoin funciona, antes de terminar esta leitura veja primeiro os 5 pontos principais desta tecnologia.
O número de compradores e detentores de BTC e outras criptomoedas vem aumentando drasticamente, muitas pessoas compram por indicação ou até mesmo por lerem notícias positivas sobre (o que é um dos piores indicadores neste mercado), mas mesmo assim temos visto um aumento na adoção o que levou a capitalização de mercado para acima dos $ 2 trilhões de dólares no momento que escrevi este artigo.
Este aumento na compra e adoção do Bitcoin é claramente um sinal positivo a todo o mercado cripto, entretanto é preocupante que grande parte destes investidores conheça tão pouco sobre aquilo que estão a comprar. A maior parte dos investidores ou especuladores novatos no mercado nem sequer sabe o que é o DINHEIRO !
Entender o dinheiro apenas como uma unidade abstrata de troca é claramente um dos maiores erros, e é verdade que existem poucos temas mais confusos e complexos que a questão do dinheiro, ainda mais quando abordamos as “políticas monetárias”, movimentos de bancos centrais, pacotes de estímulo, entre outros.
Talvez você não faça a mínima ideia do que significa estes temas aos quais acabei de falar, e é compreensível, há uma lacuna em nossa educação básica quando se trata sobre dinheiro e finanças pessoais. Isto faz com que dentre todos os problemas econômicos, a questão do dinheiro é provavelmente a mais confusa para as pessoas e por isso necessita de uma visão mais abrangente e talvez histórica para que possa ser compreendida.
Historicamente, o dinheiro foi um dos primeiros instrumentos da sociedade a ser usurpado pelo estado, e o Bitcoin, de acordo com o documento inicial de satoshi, como podem observar abaixo, nasceu com a premissa de tornar-se um “dinheiro” resistente aos controles e censuras que não precisasse de intermediários, mas ainda existem os debates para saber se Bitcoin deve ou não ser considerado dinheiro, para conseguir chegar a uma resposta mais aproximadamente assertiva sobre isso leia até o final.
Neste artigo vamos entender um pouco mais a origem do dinheiro em contexto histórico, listaremos algumas características básicas para algo se tornar dinheiro, discutiremos por quê o dinheiro é importante para a sociedade e por fim vamos entender se o Bitcoin é ou não dinheiro e qual a sua diferença para o dinheiro que utilizamos no dia-a-dia.
Como surgiu o dinheiro ?
Durante toda a nossa vida nós falamos sobre dinheiro, utilizamos dinheiro, corremos naquela busca incessante atrás do dinheiro todos os dias quando vendemos tempo, ou esforço por dinheiro e depois trocamos por itens que são de nosso interesse, sejam itens materiais ou não. Por isso para explicarmos a função do dinheiro, temos que voltar um pouco no tempo e perguntar: por que os homens fazem transações econômicas ? Por que eles trocam coisas entre si?
A troca acaba por ser a base fundamental da nossa vida econômica. Isto significa que sem trocas não haveria a economia que conhecemos hoje, consequentemente não haveria sociedade, pois o ser humano é um animal social e esta socialização é baseada na troca, seja de bens ou informações. Uma troca é uma acordo voluntário entre A e B no qual A transfere seus bens ou serviços para B, e B faz o mesmo para A. Neste espectro é óvio esperarmos que ambos visam beneficiar-se com esta troca, isto acontece porque cada um valoriza mais aquilo que irá receber do que aquilo que abriu mão.
O homem na maior parte da história tem acreditado que a troca ocorre por uma forma de igualdade de valor, que a troca em entre A e B existe porque os bens ou serviços que ambos oferecem ao outro possuem um certo nível de igualdade, e por isso é possível que haja esta transação, mas na verdade a valoração que ambos dão as coisas é diferente para cada um, ou seja, o valor dado aos bens e serviços é subjetivo entre os indivíduos, eles deram valores distintos àquilo que trocaram.
A vontade de transacionar é universal para os humanos, a grande variedade de bens e recursos existentes em nosso planeta fez com que algumas pessoas tenham habilidades e propensões a utilizarem determinados recursos mais do que outros em determinados locais geográficos distintos. Então, surge a especialização, o que permite que cada indivíduo aprimore suas melhores habilidades e que cada região geográfica desenvolva seus recursos particulares.
A transação torna-se assim algo essencial, pois sem estas trocas as pessoas teriam de viver apenas com os bens e recursos que possuem no local onde vivem e com aquilo que sabem, isto provavelmente faria a maioria morrer de fome, e os poucos que conseguiriam sobreviver estariam próximos a miséria.
Esta troca chama-se Escambo
Isto funcionou durante bastante tempo nos primórdios, entretanto esta forma de troca direta que falamos dificilmente seria capaz de manter uma economia como a que existe hoje.
Os dois maiores problemas que existem neste modelo é a “indivisibilidade” e a ausência do que é conhecido como “coincidência de desejos” (A e B precisam está necessitando exatamente do que o outro esta fornecendo no mesmo momento) , por exemplo, se A fosse um dono de terras que precisa de manteiga e lã, e B que é um produtor de Manteiga e precisa de metal para sua produção, A não teria como comprar manteiga e lã com B por que B só produz manteiga.
Isto faria com que A precisasse repartir uma parte da sua terra com B e C por exemplo, e B que é produtor de manteiga não precisa de terra, pois ele já possui, mas precisa de metal para sua produção, dessa forma esta troca não iria ocorrer entre estes indivíduos porque A não consegue repartir vários pequenos pedaços de terra e B não tem o mesmo desejo da troca.
As trocas indiretas
Para solucionar a problemática e dá mais escalabilidade à economia, o homem passou a utilizar das trocas indiretas, que é quando você vende seu produto não em troca daquele bem que você realmente deseja, mas sim em troca de um outro bem você, no futuro, poderá vir a trocar pelo o que você realmente quer.
Pegando do exemplo anterior, neste caso A precisaria encontrar alguém que vende metal e ofereceria comprar os metais pela sua terra, assim após a transação A teria o metal que B necessitava e poderia trocar por manteiga. Dessa forma, A não troca diretamente com B mas vende a C para obter metal, o que por sinal fez A fazer uma nova descoberta, que o metal que C vende é mais facilmente transacionável e que o metal é algo necessário para D, E e F, ou seja, percebeu que bem possui alta demanda que vai além até mesmo do seu consumo, por conta da comerciabilidade do metal.
A maior facilidade de trocar, vender, comprar ou dividir o metal neste nosso exemplo fez com que todos os indivíduos ficassem confiantes de que tal bem seria o item com as melhores características de meio de troca quando comparado com a manteiga, terras ou lã.
Quando observamos estas características percebemos que existem uma alta quantidade de itens na natureza que podem ser utilizados como meio de troca, mas alguns são mais demandados que outros, alguns são plenamente divisíveis em unidades menores sem que haja perda de valor, alguns são mais duráveis e outros são mais transportáveis por longas distâncias.
A medida que a sua utilização aumenta como meio de troca, estes bens se tornam mais comerciáveis, e como são mais comerciáveis acabam por ampliar o seu uso, o que reinicia o ciclo. Após algumas mercadorias se sobressaírem sobre outras, existirá cerca de uma ou duas mercadorias utilizadas como meio de troca em praticamente todas as transações. Estas mercadorias são chamadas DINHEIRO.
Ao longo da história, diversas mercadorias foram utilizadas como dinheiro: açúcar, tabaco, sal (é daí que vem a palavra salário, pois era o pagamento recebido pelo trabalho, em forma de sal), gado, pregos, cobre, e até mesmo conchas ou anzóis. Dentre todas estas mercadorias duas foram espontaneamente escolhidas como as mais eficientes formas de dinheiro pelo livre mercado, o ouro e a prata.
Antes de uma mercadoria ser definida como dinheiro, ela precisa ter um passado no qual ele foi utilizado como definidor de preços, ou seja, conhecido como uma unidade de conta e as pessoas podem calcular o preço das coisas com base neste ativo, é nesse histórico que a demanda será baseada. Portanto, o governo é completamente impotente para criar um dinheiro do nada, isso acontece porque:
“O dinheiro só pode surgir e evoluir pelo processo de livre mercado. ” Murray N. Rothbard
Por isso, a principal lição que devemos tirar de todo este estudo até aqui é que o dinheiro é uma mercadoria. As pessoas costumam pensar no dinheiro como uma forma abstrata de troca ou de meio de conta, separando do conceito concreto do seu papel, o dinheiro não é apenas para trocas, o dinheiro basicamente é uma mercadoria e como toda as mercadorias, o seu “preço” é determinado pela relação entre a sua oferta total, ou estoque, e sua demanda total das pessoas que querem utilizá-lo ou guardá-lo. Devemos entender que as pessoas compram dinheiro através da venda do seu trabalho ou bens, e vendem seu dinheiro para comprar bens ou serviços.
O mercado que manda, ou deveria mandar!
Sem um meio geral de troca seria impossível haver a especialização dos fatores de produção, e uma genuína divisão do trabalho. Os problemas que falamos anteriormente de indivisibilidade, coincidência de desejos, transporte, aceitação generalizada e demanda foram solucionados através do dinheiro.
Além do fato de que o dinheiro possibilitou uma unidade geral de conta, onde é possível estipular os preços, o que permite os empreendedores realizarem o cálculo econômico e através deste podem perceber como se comporta a oferta/demanda do mercado e estudarem os custos de produção. Somente estes cálculos permitem a melhor alocação de recursos para a máxima produtividade. Mises explicou muito bem como uma sociedade sem preços estaria destinada a ruína, sem o cálculo econômico seria impossível a alocação inteligente dos recursos escassos, mas isto é conversa para um outro artigo.
Quando citei os problemas que foram solucionados pelo dinheiro, se vocês estiverem bem atentos perceberão que estes pontos citados são aquilo que formam os pressupostos ou características básicas para denominar algo como dinheiro, mas faltou um último ponto: escassez.
Este é o mais simples de entender e o mais difícil de estudar, e vou te explicar porque: é óbvio que o dinheiro tem que ser uma mercadoria escassa, afinal de contas se eu pudesse facilmente criar dinheiro ele rapidamente deixaria de ser aceito, se fosse fácil qualquer pessoa encontrar ouro apenas cavando no chão ele não seria a reserva de valor que é, não faria sentido.
Por isso, quando falamos em estoque total de uma mercadoria, ou oferta total significa que aquilo tem quantidade limitada ou então em casos de não ser limitada, é muito difícil de se obter.
A problemática disso tudo vem quando pensamos: o dinheiro que usamos é escasso ? ele tem limite de fornecimento ? Bom, é ai que entra a parte difícil da questão, porque começam questões de políticas monetárias que citei na introdução do artigo, mas como prometi que vamos tentar simplificar ao máximo o entendimento não vamos aprofundar nestas questões (por enquanto).
O que deve ficar massificado é que como o dinheiro é uma mercadoria como todas as outras, o aumento da oferta de dinheiro sem que haja aumento na demanda fará com que cada moeda reduza o seu preço, isso mesmo, o “preço do dinheiro” é basicamente o poder de compra daquela unidade monetária.
Você deve está se perguntando, “mas o que determina o preço do dinheiro?”. As mesmas forças que determinam os preços de todas as outras mercadorias que existem no mercado, a velha lei de “oferta e demanda”. Exatamente por isso que um aumenta na oferta de dinheiro tenderá a reduzir o seu preço, assim como um aumento na demanda tenderá a aumentar seu preço. Imagine que alguém pudesse magicamente triplicar a quantidade de ouro existente, isso significaria que todos ficariam mais ricos ?
No primeiro momento sim, os que recebessem este ouro novo poderiam até se sentirem mais ricos, mas isto não duraria muito tempo, logo o mercado estabilizaria o preço do ouro e cada unidade nova de ouro que foi inserida no sistema diluiria o valor das unidades que já existiam, quando as pessoas corressem para gastar esse novo ouro os preços das mercadorias aumentariam de valor.
Finalmente, Bitcoin é dinheiro ?
Eu falei que iríamos discutir sobre esta grande questão, mas eu prefiro não dá uma resposta exata, ao invés disso iremos fazer um exercício reflexão para saber se você entendeu tudo que foi dito neste artigo. Para isso vou enumerar as características que já falei anteriormente que são as primordiais para que algo seja considerado dinheiro e iremos analisar se o Bitcoin possui estas características, eu darei uma cola ao lado de cada item caso você não tenha certeza da característica.
Divisibilidade. (o Bitcoin pode ser fracionado em até 8 casas decimais, ou seja, você pode 0,00000001 Bitcoin, estas frações são chamadas “satoshis”).
Fácil transporte (O Bitcoin é uma moeda digital, que pode ser transacionada para qualquer lugar do planeta e só leva cerca de 10 minutos para concluir).
Escassez (O Bitcoin possui fornecimento máximo de 20 milhões de unidades)
Aceitação geral (Este tópico sugiro que busque nas notícias as empresas que aderiram recentemente, por exemplo, no momento que estou escrevendo empresas como a Tesla, Microstrategy, Visa, entre outras começaram a comprar, ou aceitar Bitcoin).
Histórico como meio de troca ( O Bitcoin ainda é muito novo, pouco mais de 12 anos de existência, entretanto com cartões de corretoras ou através da visa é possível pagar qualquer coisa com Bitcoin).
Unidade de conta (Este talvez seja o último estágio para o bitcoin).
De fato podemos perceber que alguns destas características talvez ainda não tenham sido consagradas pelo bitcoin, ser amplamente aceito e funcionar como uma unidade de conta talvez sejam os passos mais largos que ainda não demos, entretanto a curva de adoção e redução da volatilidade é notável e poderemos em breve ter todas as características para o bitcoin ser considerado dinheiro.
Mas o grande fator chave é entender que o Bitcoin como forma de dinheiro é um ativo que pode ser transacionado para todos os lugares do mundo, independentemente se o indivíduo possui conta no banco ou não, se é de classe social alta ou baixa, se é branco ou negro, homem, mulher, etc. O Bitcoin não tem preconceitos, e além disso, não pode controlado. Como vimos o aumento da oferta de um dinheiro dilui o seu valor, isto não acontece com o Bitcoin, nenhum governo, empresa ou pessoa pode aumentar ou controlar o Bitcoin, tudo isto é possível por causa da tecnologia blockchain.
Bom, agora que você já sabe o que é o dinheiro talvez tenha percebido a importância das criptomoedas para a evolução do sistema monetário e entendido que isto é um caminho que não há mais volta, o sistema monetário está mudando e vai continuar em constante mudança nos próximos anos ou décadas.
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